Provocados pelo grande número de incêndios em favelas e moradias
precárias na cidade de São Paulo, entidades e movimentos sociais
organizaram um debate na Universidade de São Paulo nesta quarta-feira
(10) para discutir o tema e organizar iniciativas de solidariedade às
famílias desabrigadas. O jornalista José Arbex Jr. abriu dizendo que
“não devemos relacionar este fenômeno nem só a São Paulo nem só ao
Brasil. Estamos diante de um processo universal, em que a crise do
capital, quanto mais ela se acentua, quanto mais veem que não há saída,
mais acontece esta desumanização dos pobres, daqueles que não são
consumidores. É uma forma de eliminá-los”.
Arbex, que também é
escritor e professor da PUC-SP, foi duro ao falar sobre a aceitação da
sociedade diante do discurso da grande mídia. Na ocasião, usou como
exemplo a versão de que o incêndio na Favela do Moinho teria iniciado
com uma briga entre travestis, fator que o alarmou já que estas são uma
das personagens mais atacadas pela mídia e pelo senso comum da
sociedade. A versão da mídia, portanto, alimentaria a rejeição da
sociedade também às travestis, e facilitaria a incorporação pela classe
média paulistana de que os culpados pelos incêndios são os próprios
moradores.
“O incêndio da favela não é apenas um fenômeno
circunscrito à disputa imobiliária nem à especulação produzida pela Copa
do Mundo e pelos Jogos Olímpicos. É também isso, mas é muito mais
grave. Porque nos leva a perguntar: como é possível a mídia articular
este discurso e não ser atacada? Isso é o grave, pois indica um certo
entorpecimento das consciências e uma aceitação passiva desta
narrativa”, arrematou o professor.
Morador e liderança da Favela
do Moinho, Milton Sales endossou a crítica à mídia ao dizer que “é um
bando de pau mandado” dos grandes empresários. Miltão, como é conhecido,
afirmou que os valores individualistas, consumistas e violentos
transmitidos na televisão brasileira também afetam os moradores de
favelas.
Givanildo Manoel, militante do Tribunal Popular, relatou uma série de projetos que estão em curso na cidade
e denunciou o episódio ocorrido na Favela do Piolho, onde vários
fatores indicam o caráter criminoso dos incêndios. “Essa política só é
possível de ser implementada por conta do processo de militarização da
cidade”, disse Givanildo em referencia aos militares alocados em quase
todas as subprefeituras e à chamada “bancada da bala” recentemente
eleita na Câmara dos Vereadores.
As Unidades de Polícia
Pacificadora (UPPs) implementadas no Rio de Janeiro reforçam a tese de
Givanildo, inclusive por abrirem espaço para empresas na favelas. Em São
Paulo, o militante acredita que os projetos imobiliários voltados para
as periferias, acompanhados da violenta ação policial, alimentam o setor
imobiliário e visam expulsar populações pobres para ainda mais longe do
centro da cidade.
O professor do Departamento de História da
USP, Jorge Grespan, seguiu na mesma toada e disse que “o fato é que
essas áreas precisam ser desocupadas para que o capital financeiro tenha
poder de abocanhar pedaços maiores da mais valia”. Grespan relacionou
as várias formas de exploração sofridas pelos moradores de favela. “É a
exploração tanto pelo patrão como pelo setor financeiro pago pelo
patrão”, disse.
Várias intervenções dos estudantes presentes na
plateia questionavam como a população poderia reagir diante deste
processo de reorganização da cidade que prejudica os mais pobres. Todos
os debatedores citaram as dificuldades de organização popular na atual
conjuntura, mas endossaram a convocatória das iniciativas já agendadas.
No dia 13 está marcado um panelaço às 14 horas em frente à Favela do
Moinho, e no dia 1º de dezembro, data de inicio da Lei Geral da Copa,
deverão ocorrer novas manifestações.
http://www.cartamaior.com.br/template/materiaMostrar.cfm?materia_id=21059
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